quinta-feira, 18 de março de 2010

Entre, pegue um casaco, vai fazer frio...

Antes ela nunca entendera o que eram olhos de ressaca, como Machado referia-se aos de Capitu em Dom Casmurro. Até então nunca sentira algo tão intenso como naquele inverno de 87.
Tarde fria de uma quarta-feira, ou era uma quinta? Quinta-feira, um pouco confusa mas não tinha como esquecer. Ele surgiu quando ela estava sentada, perdida em seu mundo solitário, alheia à multidão que a cercava. Ela o esperava, sempre esperou, sabia que um dia ele viria, não sabia quando exatamente, mas ali estava ele, parado a sua frente, ela cabisbaixa viu apenas suas mãos, segurava um cigarro, cigarro que ali estava mais pra aquecê-lo, já que poucas vezes o tragava. Não teve coragem de encará-lo, tentava esconder-se entre as mechas de seu cabelo. Ele pegou sua mão, estava gelada, só ouviu ele dizer: "vem comigo", ela ainda cabisbaixa fez sinal que sim com a cabeça, sentiu-se segura, sabia que de qualquer forma estaria segura com ele, e isso é o que mais lhe satisfazia.
Foram horas de conversas, momentos de lucidez como nunca tivera igual, afinal, nunca ninguém lhe entendera, nunca ninguém quis aprofundar-se em seus pensamentos.
Já era noite, passada das 3 da madrugada, estava mais frio que antes, porém sua alma e coração estavam aquecidos, e isso era reconfortante, não importa o frio de fora, mas o calor de dentro.
Tarde para muitos, mas cedo pra ela que aprendeu a esperar pela pessoa certa que a compreendesse, que estava ali, parado, enquanto ela falava suas aflições, sonhos e esperanças.
Foi quando o que já era previsto aconteceu, ele, pegou sua mão e disse: "Entre, pegue um casaco, vai fazer frio", ela pela primeira vez ergueu a cabeça, e foi quando deparou-se com os olhos dele, eram verdes da cor do mar, eles puxavam-na para seu interior, sentiu-se atraída por aqueles "olhos de ressaca", foram poucos instantes, porém os mais intensos já vividos por ela.
Deixou-o na calçada, entrou rapidamente em casa pra pegar o casaco, não queria perder nenhum momento com ele, foi quando na volta, surpreendeu-se, ele não estava mais lá, partirá sem dizer ao menos adeus.
Dias após dias ela sentia que o frio só aumentava, era o frio da alma, do coração; foi então que entendeu a última frase, não era o frio daquela noite de inverno que ele referia-se quando falou do casaco, mas sim do frio da alma que ela sentiria com sua partida, foi seu modo de despedir-se.
Ela nunca esquecera daqueles olhos, lembra-se sempre dele com ternura.

"Entre, pegue um casaco, vai fazer frio"...

Beijos

6 comentários:

  1. Oi. Quando cheguei na Capitu quase desisti. É teu o texto? Achei legal. Vou te seguir para ver o blog com calma(é uma ameaça..rsrs). Bjs.

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  2. Aí sim, fomos surpreendidos novamente...texto maravilhoso !! Parabéns, minha gaúcha !!

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  3. Me levou a refletir sobre as perdas ou ausências...
    É uma realidade avassaladora que chega inesperadamente e quando nos damos conta .... já se foi....!!!

    Gostei garota...escreves bem...
    Se puder visita tbm: http://lucassbraga.blogspot.com/

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  4. Muito bom seu texto Nathy ^^. Me lebrou um pouco crepúsculo no começo..mas só no começo mesmo. O cigarro pra aquecer.... achei interessante.

    Show de bola.

    www.imagever.blogspot.com

    Esse é o meu ^^.. abraço

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